Por mais representatividade LGBTQIA+ na Arquitetura e no Urbanismo

Clevio Rabelo sempre soube que iria fazer Arquitetura. “Desde criança eu gosto de desenhar em cima de malhas e fazer desenhos geométricos”, rememora. Nascido no interior do Ceará, ele estudou o ensino médio em uma escola técnica, onde fez o curso de edificações. Em 1996, seguindo o caminho esperado, ingressou no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (UFC). Hoje, aos 43 anos, é doutor em História da Arquitetura, professor de Projeto Arquitetônico na UFC e coordenador do grupo de estudos Arquitetura Bicha.

Apesar de considerar que o ambiente acadêmico ainda pode ser muito opressor para a comunidade, o cearense explica que é evidente o crescimento no número desses estudantes dentro das universidades. “Na minha época, vários amiges só ‘saíram do armário’ depois de terminar o curso. E a gente sabe de pessoas transgêneras que não permaneceram na faculdade”, conta. Ele comenta que o debate sobre as questões de sexualidade e gênero estão ganhando mais destaque na sala de aula graças à visibilidade LGBTQIA+ dentro do curso.

Para Rabelo, a Arquitetura ainda precisa avançar muito quando o assunto é a pauta de gênero e sexualidade, afinal, ainda há aqueles que acreditam que as duas coisas não se misturam. Foi pensando nisso que, em 2020, o profissional decidiu criar o grupo de estudos Arquitetura Bicha. O coletivo, que também tem perfil no Instagram, levanta a temática no contexto da produção e apropriação da Arquitetura, com objetivo de divulgar obras arquitetônicas feitas por pessoas LGBTQIA+ e gerar representatividade dentro da categoria.

Em 2004, o arquiteto e urbanista se mudou para São Paulo (SP) para cursar o mestrado na Universidade Presbiteriana Mackenzie e, logo em seguida, engatou o doutorado na Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAUUSP). Morar na capital paulista, entretanto, também acabou se tornando uma oportunidade de estar em um espaço onde as pessoas se sentem mais livres e mais abertas para se expressarem. Esse contato lhe rendeu questionamentos sobre a presença de pessoas LGBTQIA+ na Arquitetura. “Eu queria trabalhar nos grandes escritórios, mas lá só tinham homens brancos, héteros e cisgêneros”, diz. No início, ele acreditava que era uma questão social – não ser de São Paulo e não ter estudado nos mesmos lugares – mas, hoje, encara isso como uma questão de sexualidade. “Na minha época, lugar de LGBTQIA+ era nos escritórios de interiores, cenografia e design gráfico”, expõe.

De acordo com o professor, existe uma ideia de que o cerne da Arquitetura está somente na construção de grandes projetos e encomendas públicas, e não há pluralidade em quem faz esses projetos no Brasil. “Se você diz que existe bicha na decoração, está tudo bem. Agora, dizer que essas pessoas estão na Arquitetura, não é aceito e a sensação é de que a gente está querendo invadir essa Arquitetura com ‘a’ maiúsculo”.

Mas a comunidade LGBTQIA+ está em todos os lugares, as pessoas que, muitas vezes, optam por não ver. Para Rabelo, a questão da representatividade é muito importante, justamente porque os alunos precisam saber que eles podem ser grandes profissionais, independentes da sexualidade ou gênero. “Quando eu comecei o Arquitetura Bicha, os alunes me diziam: ‘é muito legal saber que pessoas como eu podem se tornar um Burle Marx”. Roberto Burle Marx (1909-1994), que era gay, foi considerado um dos melhores paisagistas do país, inclusive, tendo introduzido o paisagismo modernista no Brasil.

A luta de Rabelo acabou se tornando essa: tornar a Arquitetura feita por pessoas LGBTQIA+ mais conhecida, admirada e possível.

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