Ensinar Urbanismo nas escolas é desenhar um novo futuro para o Brasil

Incluir o ensino de Urbanismo hoje nas escolas brasileiras é uma ferramenta essencial na defesa das cidades e de um ambiente mais justo e democrático no futuro. A posição, defendida por arquitetos, urbanistas e professores, é uma forma de alimentar uma nova geração de crianças e adultos mais conscientes sobre suas responsabilidades no desenvolvimento de centros urbanos e rurais. Segundo a presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Andréa dos Santos, há uma lacuna na formação do cidadão brasileiro. “A  educação sobre urbanismo deve começar na infância. Quando, durante o crescimento, nos apropriamos dos nossos espaços, entendemos que eles são feitos por nós e para nós”, ressalta.


Porém, conquistar o universo infantil não é uma tarefa simples. Atualmente, diversos projetos vêm sendo articulados para engajar o público mais jovem na causa do urbanismo. Um deles é o CoCriança, uma organização que promove oficinas lúdicas e trabalha a cidadania e a cocriação de espaços com crianças. Por meio dele, surgiu o Trilhas Urbanas, um jogo de tabuleiro que, a cada etapa, permite que os jogadores alterem o futuro da cidade através da criação de soluções urbanas, fomentando a cooperação para resolução de problemas, o estímulo à cidadania e ao direito à cidade, o debate de políticas públicas e a construção de cidades mais humanizadas. Segundo a desenvolvedora do jogo, arquiteta e urbanista de São Paulo, Beatriz Martinez, o principal objetivo do Trilhas Urbanas é combinar diversão e educação, considerando toda a riqueza e repertório das crianças no processo de brincar e aprender. “O jogo é estruturado para incentivar mais perguntas do que fornecer respostas diretas, promovendo um ambiente coletivo onde os aprendizados mais valiosos surgem do diálogo e da interação entre os jogadores”. Ao desenvolvê-lo, conta a arquiteta, o foco foi fornecer às escolas públicas uma ferramenta que não só auxiliasse os professores a escutar mais as crianças, mas também as capacitasse a se reconhecerem como protagonistas de seu próprio aprendizado, especialmente em relação à compreensão do mundo.

Beatriz Martinez reforça que o ensino de urbanismo nas escolas contribui significativamente para o desenvolvimento de um caráter mais cidadão. “Jogos introduzem o lúdico na aprendizagem, e é crucial entender que este lúdico não é meramente uma roupagem para tornar o conteúdo mais atrativo. A natureza lúdica dos jogos redefine regras e limites, incentivando os alunos a usarem sua criatividade para repensar o mundo e suas soluções. O lúdico quebra barreiras, permitindo abordagens e perspectivas inovadoras”, finaliza.


Atualmente, o game pode ser adquirido de forma individual, em kits escolares e pela opção “Apoie uma escola”, em que o apoiador pode escolher uma escola pública para receber um kit de jogos e organizar um debate com a desenvolvedora do Trilhas. O lançamento oficial está programado para dezembro, antes do Natal. Mais informações podem ser obtidas através do link: catarse.me/trilhasurbanas.

Outra abordagem, em formato on-line, é o Cidade em Jogo, um game desenvolvido pela Fundação Brava e pelo Brazil Institute do Woodrow Wilson Center que se propõem a mostrar como funciona a gestão de um município. Durante a atividade, a criança assume o papel de prefeito por um dia, decidindo quais são as melhores soluções para a cidade fictícia. Neste processo, os participantes da brincadeira são estimulados a pensar de forma crítica e discutir diferentes pontos de vista sobre questões, como mobilidade urbana, acessibilidade, sustentabilidade, inovação, etc. 

Com uma perspectiva de ensino diferente, mas de forma igualmente lúdica, a arquiteta, professora universitária e autora de livros infantis sobre urbanismo, Ana Paula Alcantara, vê a leitura como uma forma de trabalhar o urbanismo nas escolas. “Tenho trabalhado através dos livros. Em vez de decorar datas e nomes para cumprir uma obrigação escolar, as crianças (de todas as idades) são incentivadas a vivenciar a história da cidade, construindo uma relação entre os acontecimentos e os espaços urbanos. Meus livros propõem que as crianças conheçam a evolução urbana da sua cidade em sala de aula e, depois, saiam às ruas para viverem suas próprias experiências, sabendo bem onde estão pisando.” Ela também reforça que a cidade deve ser vivenciada e as crianças podem, e devem, criar suas próprias memórias afetivas nas ruas e praças. 

Educação começa em casa

Outro fator importante, é entender que a educação em urbanismo não precisa ser iniciada apenas na escola. Os pais também podem começar estes ensinamentos em atividades simples do dia a dia, como em caminhadas pelos parques e praças do bairro. Desta forma, as crianças apropriam-se dos espaços e compreendem seus significados, reforçando os laços com o local. “A memória, quando resgatada e apresentada de forma leve, responsável e divertida, emerge de cada canto da cidade e os induzem a reinterpretar seu próprio passado, a ancorar sua existência no presente e a construir um futuro mais consciente. Os pais podem e devem propor passeios por lugares com significados nas cidades. Shopping não vale. A ideia é que as famílias incentivem e promovam atividades em que a criança possa vivenciar o espaço urbano”, reforça a professora.

Para incentivar o ensino de urbanismo nas escolas, a Comissão de Política Urbana e Ambiental do CAU/BR (CPUA-CAU/BR), constituiu, em 2018, o CAU Educa, um programa de educação processual  e contínua para a construção de consciência urbana e ambiental dos futuros cidadãos brasileiros e que hoje estão no ensino fundamental. O projeto destina-se, não apenas a arquitetos e urbanistas, mas também a educadores, gestores públicos, instituições e outros interessados em aprender a educar sobre a temática. Para saber mais, acesse https://caubr.gov.br/caueduca/. O programa também disponibiliza um caderno de apresentação da iniciativa. O material completo está disponível aqui.

Foto: Carolina Jardine

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