Aya Nishimuta: quando a Athis chega ao campo

Ela sempre foi uma mulher sem fronteiras. Nascida na cidade de Fujinomiya, no Japão, Aya Nishimuta chegou ao Brasil ainda menina para mostrar que não há limites territoriais para o exercício do papel social do arquiteto e urbanistas. Na sua jornada profissional, mais do que unir as tradições de dois países tão diferentes, destacou-se por levar a Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social (ATHIS) e os conceitos que norteiam o urbano para o meio rural.

Aya Nishimuta chegou ao Brasil aos cinco anos e se instalou na cidade de Maringá (PR), região tradicional pela produção agrícola. Apesar de ter trilhado sua carreira em solo brasileiro admite que o Japão está no centro de sua escolha profissional. “Eu era habituada ao desenho, principalmente por ser uma parte cultural para os nipo descendentes. Somos estimulados desde criança”.

Sua jornada acadêmica trouxe muitas experiências novas e a descoberta de áreas pouco abordadas dentro do curso de Arquitetura e Urbanismo. Formada pela Universidade Estadual de Maringá (UEM) em 2020, atuou em pesquisas voltadas a políticas públicas e integrou o Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo (SOMA), onde teve seu contato inicial com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Foi ali que começou a ver o meio rural com interesse. Atualmente, a arquiteta compõe a equipe técnica do Canteiro autogestionário dentro do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, vinculado ao setor de infraestrutura e produção.

A arquiteta e urbanista se aproximou da ATHIS por intermédio do Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo (EMAU), que visa a melhoria da formação profissional proporcionando vivências com a população e experiências teóricas e práticas. O projeto surgiu em um modelo de auto-organização dos próprios estudantes, visto que nenhum professor aceitava o cargo de coordenador para que o curso fosse classificado como extensão. E quando aceitavam, recorda a arquiteta, raramente ficavam mais de um ano no cargo. “Aqui no sul do Brasil, a extensão é muito desvalorizada, principalmente nas universidades estaduais, nas federais ainda existe bastante estímulo das extensões”.

Assim como nas cidades, a ATHIS Rural é uma garantia dos cidadãos prevista na Lei Federal 11.888/2008. O grande desafio, indica ela, é o arquiteto urbanista enxergar além do perímetro urbano. “O próprio nome do curso já o limita a esse meio”, admite.

Aya aponta que um dos primeiros desafios ao entrar em contato com a ATHIS é possuir um olhar extremamente urbano-centrista, pois a questão da formação do território tanto histórico quanto o processo, até mesmo a arquitetura, é muito específica. “Principalmente quando falamos sobre o movimento social com o MST, assim você entende quanto espaço conflito agrário”. O debate vai além das questões orçamentárias ou normativas dos programas, mas sim vincular a um dos problemas mais antigos do Brasil, que é a questão agrária. Principalmente que esses territórios revelam uma estrutura fundiária baseada no latifúndio e na grilagem, degradação ambiental, nos conflitos fundiários juntos aos setores do agronegócio e os impactos na vida cotidiana dos povos do campo, das florestas e das águas. E compreender a maneira como a população desses territórios se relaciona com o meio urbano, com a população e o poder público local. É entender o nosso papel a partir do conceito de habitat rural que vai além da casa em si e que abrange toda uma estrutura necessária para a reprodução da vida (equipamentos coletivos, infraestrutura, serviços) .

Mas o principal desafio é não existir uma formação para tal. Além da falta de formação própria em Athis, há grandes limitações de atuação no campo uma vez que a universidade nega que a maior parte do território brasileiro seja rural. Consciente dos gargalos de formação nessa área, a profissional defende que a capacitação para Assessoria Técnica para Arquitetos e Urbanistas é o primeiro passo necessário. “Eu participei da primeira formação em Assessoria Técnica no meio Rural que teve.”

Em meio a tantas mudanças que ainda precisam ser feitas, Aya não descarta novos caminhos em seu futuro, que se entrelaçam com a ATHIS, dentro das extensões na universidade, mestrado e doutorado fazem parte dos seus planos. “O MST me ensinou que se temos a crítica dentro do corpo docente, temos que propor uma solução e disputar esses espaços”.

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