Os eventos climáticos acontecidos nos últimos anos em todos os estados brasileiros têm preocupado especialistas de todas as categorias. Da seca à enchente, a preocupação com grupos sociais vulneráveis têm aumentado de forma exponencial, destacando falhas nos meios em que se pensa condições habitacionais para essas pessoas. Com 9 milhões de brasileiros e brasileiras vivendo em áreas de risco, garantir a sobrevivência é insuficiente para quem ainda não tem direito à moradia.
De acordo com a Agência Senado, o Brasil tem mais de um terço de seus municípios — 1.942, do total de 5.570 — com moradores em áreas de maior vulnerabilidade, onde a possibilidade de eventos geo-hidrológicos, como deslizamentos, enxurradas e inundações, é reconhecidamente multiplicada. Apesar de haver imposição constitucional à União, aos estados e aos municípios de melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico, esse direito não é cumprido quando ainda há cerca de 9 milhões de brasileiros vivendo em áreas de risco.
Mapeamento feito pelo Ministério das Cidades e da Casa Civil mostra que o número de cidades com moradores em área de risco é 136% maior na comparação com levantamento feito a 12 anos atrás, quando havia 821 municípios na lista dos mais vulneráveis.
Dadas as altíssimas temperaturas, fortes secas e enchentes até então nunca registradas, as populações vulneráveis são as mais afetadas no enfrentamento crescente de ameaças à sua segurança e meios de subsistência. Ou seja, as ocupações de lugares inadequados provocadas pela segregação socioterritorial e urbanização rápida tornam-as mais suscetíveis às ocorrências de inundações e deslizamentos de terra, reforçando o debate sobre direito à moradia quando se pensa onde essas pessoas irão morar durante e depois dos eventos climáticos extremos.
Conforme a presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Andréa dos Santos, “é preciso disponibilizar áreas adequadas, acessíveis e com infraestrutura para que as famílias mais pobres possam ter as mesmas condições de toda a população.”
Isso também expõe que as famílias instaladas nas áreas de risco precisam compreender e dialogar, junto com os mais diversos profissionais, sobre os riscos das áreas vulneráveis onde estão ou estavam instaladas e se colocarem na situação de protagonistas de um processo que necessita de todo um deslocamento para nova área habitacional, que envolve aspectos sociais, econômicos, culturais e a própria história das famílias e das comunidades.
Ao mencionar que o trabalho social é fundamental para que as famílias consigam entender e se adaptar a uma nova realidade, a presidente da FNA comenta:
“Do ponto de vista da infraestrutura urbana e de moradia, nada adiantará reconstruir as cidades sem trabalho social, psicológico e emocional com essa população. Reconstruir cidades, muitas vezes, não é suficiente diante das perdas sofridas pelas famílias.”
As enchentes que devastaram parte das cidades do Rio Grande do Sul mostram que as dificuldades para idosos, pessoas com deficiência, pessoas acamadas, gestantes e/ou puérperas, crianças e adolescentes seguem aumentando. Nos 864 abrigos provisórios, das 67,1 mil pessoas acolhidas, 14,6 mil eram crianças e adolescentes, 7,2 mil eram idosos e 2 mil, pessoas com deficiência.
Algumas medidas cabíveis são o mapeamento prévio da localização de pessoas vulneráveis feito pelo Estado pode ajudar a salvar mais vidas em situação de calamidade pública, assim como a sanção de leis como a Lei n° 14.750/2023, que amplia os instrumentos de prevenção de desastres e recuperação de áreas atingidas, cabe competência de nível municipal a federal no monitoramento de riscos de acidentes e/ou desastres e de produção de alertas antecipados.
Desta maneira, reforçar o debate em todas as instâncias da sociedade para que o direito à moradia seja de fato exercido para que as populações vulneráveis possam, em um futuro próximo, deixar de ser vulneráveis.
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil