CAU/BR aciona Andrade Gutierrez por difamação de arquitetos e urbanistas

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR) protocolou na sexta-feira (3/03) na Justiça Federal do Distrito Federal ação contra a Construtora Andrade Gutierrez com pedido de liminar objetivando a sustação da veiculação, em emissoras de rádio nacionais, de “spot” de campanha da empreiteira considerado difamatório contra a categoria de arquitetos e urbanistas por caracterizá-los como negligentes, imperitos e irresponsáveis. A empreiteira, uma das maiores do país, recorde-se, foi a primeira a assinar acordo de leniência com o Ministério Público Federal, em maio de 2016, por seu envolvimento em atos de corrupção descobertos pela Operação Lava-Jato.

O áudio repudiado pelo CAU/BR é o episódio “O contrato vale para todo mundo”, da série “A melhor maneira de agir”. A peça publicitária simula o diálogo de dois homens onde se transmite a ideia de que o arquiteto responsável pelo projeto e construção da casa de um deles, “inverteu” a posição do banheiro de sua esposa, não reconheceu seu suposto erro recusando-se a corrigi-lo, não cumpriu o contrato assinado com o cliente e foi responsável pelo “tempão” de duração da obra. E ainda o iguala a políticos corruptos.

A empreiteira, diz a ação do CAU/BR, não tem o direito de, “com o intuito de resgatar a credibilidade afetada pela participação em ilícitos, ofender a credibilidade e respeitabilidade de toda uma categoria profissional”.

O Conselho solicitou ainda reparação de danos mediante punição à empreiteira para a veicular mensagem publicitárias – a ser elaborada pelo CAU/BR e devidamente aprovada pela Justiça – que esclareça a sociedade sobre a importância, participação efetiva e responsabilidades dos arquitetos e urbanistas na elaboração de projetos arquitetônicos (de edificações) e execução de obras. A mensagem deverá se dar nos mesmos veículos, horários e em quantidades com que foram veiculados o “spot” ofensivo aos arquitetos e urbanistas”. Foi pedido também pagamento de indenização por danos morais coletivos, no montante de R$ 200 mil, a ser revertido às entidades nacionais dos arquitetos e urbanistas para uso exclusivo em campanhas de valorização profissional.

Em paralelo à ação judicial, o presidente do CAU/BR, Haroldo Pinheiro, agindo em seu próprio nome, entrou com pedido de reclamação junto ao CONAR (Conselho Nacional de Autoregulamentação Publicitária), solicitando a abertura de um processo ético. ‘Sinto-me ofendido, como cidadão, arquiteto e urbanista. E não tenho dúvidas de que os arquitetos e urbanistas que trabalham ou prestam serviços para a empreiteira compartilham do mesmo sentimento”.

Ele acentua que “a campanha é, ainda, discriminatória, pois em outra mensagem do conjunto dos “spots” que a compõem, há uma peça que enaltece o profissional engenheiro, dando-lhe um tratamento elevado e diverso do que é prestado ao arquiteto e urbanista”.

COMPARAÇÃO IMPERTINENTE – O áudio induz o entendimento de que o suposto arquiteto estaria intimidando o contratante de seus serviços, para, a seguir, fazer uma analogia com a necessidade de recorrer a políticos para que as coisas andem. “Com o grau de deterioração que a classe política vem experimentando na sociedade, qualquer equiparação de profissionais a esse segmento é lesivo a sua conduta e reputação”, afirma a ação ingressada na Justiça.

A equiparação macula a imagem dos arquitetos e urbanistas, diz a ação, ofendendo “toda uma comunidade de mais de 144 mil profissionais do País todo, que diferentemente da classe política, tem no seu trabalho e na sua reputação o maior patrimônio a ser preservado”.

O acordo de leniência da Andrade Gutierrez, homologado pelo juiz federal Sérgio Moro, da Justiça Federal do Paraná, foi motivado por delação premiada de onze de seus executivos, revelando esquemas de corrupção na Petrobrás, em obras da Copa do Mundo e na usina de Belo Monte. Com o acordo, a construtora comprometeu-se pagar uma indenização de R$ 1,0 bilhão, podendo em troca voltar a participar de concorrências de obras públicas.

Na época, a empresa divulgou pela imprensa nacional e em seu site um “Pedido de desculpas e manifesto por um Brasil melhor”, assumindo ter cometido “graves erros” e apresentando oito propostas para “colaborar com a construção de um Brasil melhor, mais próspero, justo e desenvolvido”. No entender do CAU/BR a campanha da empreiteira descumpre a promessa que ela fez à sociedade e próprio Código de Ética que publica em seu site.

 

FALSA MENSAGEM – A ação judicial lembra que “o arquiteto e urbanista é o profissional com competências e habilidades para elaborar e executar o projeto arquitetônico, não sendo razoável que uma peça de publicidade atribua a esse profissional a “inversão total” do projeto. Imaginar que o arquiteto e urbanista – que é o profissional que tem a maior carga horária acadêmica de formação na área de projetos arquitetônicos – teria errado a sua execução seria o caos total nas obras de edificação. O arquiteto e urbanista (…) está plenamente habilitado a desenvolver, resolver e dar soluções a todas as questões relacionadas aos projetos e às obras de edificações.

“Também, pelo grau de responsabilidades que se compreende nas competências e habilidades dos arquitetos e urbanistas, não se concebem atitudes irracionais tais como a descrita na publicidade, de que o “arquiteto”, tendo supostamente errado, se recusasse a “voltar atrás”. A carga de conhecimentos dos arquitetos e urbanistas, seja no que se refere à concepção do projeto como à execução das obras, também não é compatível com a crítica que a publicidade faz de que a obra estaria “durando um tempão …”. “

Segundo o CAU/BR, a mensagem transmitida pela empreiteira à sociedade é falsa e leviana. Além disso, “atribuir aos arquitetos e urbanistas condutas de intimidação para com seus clientes é confundir o papel de parceria desse profissional com o contratante de seus serviços. Em havendo, todavia, essas condutas seriam prontamente repelidas pelos Conselhos de Arquitetura e Urbanismo, que ora se incumbem da orientação, disciplina e fiscalização da profissão de arquiteto e urbanista”.

 

DISCRIMINAÇÃO – Em outro “spot” da campanha, o episódio “Tudo começa no projeto” é possível perceber o tratamento distintivo que a empreiteira dá ao “engenheiro”. Um dos personagens diz que a obra de sua casa “está redondinha” porque antes de começar a faze-la contratou um engenheiro “e a gente fez um projeto detalhado de tudo nos mínimos detalhes.”

O áudio, diz o CAU/BR, induz a sociedade a entender que os engenheiros são os mais mais habilitados a projetarem e executarem as edificações destinadas à ocupação humana, principalmente as unifamiliares. “Todavia, a publicidade erra, pois nenhum engenheiro, nem o engenheiro civil, tem competências e habilidades para elaborar o projeto arquitetônico – e menos ainda o “projeto detalhado de tudo nos mínimos detalhes” –, embora tenham plenas atribuições para a execução da obra de edificação”

Dessa forma, “além de fazer referências nocivas e incorretas sobre o arquiteto e urbanista, a publicidade se refere ao “engenheiro”, de forma generalista, e atribui-lhe competências que esse profissional nem mesmo detém”.

“Disso se conclui que os dois “spots” não trazem qualquer proveito ao esclarecimento da sociedade”.

 

 

O “SPOT” – Degravação do episódio “O contrato vale para todo mundo”, da série “A melhor maneira de agir”, da campanha veiculada pela Construtora Andrade Gutierrez em emissoras de rádio nacionais:

“Locutor: Grupo Andrade Gutierrez apresenta: A melhor maneira de agir. Episódio de hoje: O contrato vale “pra todo mundo”

Personagem 1: Fala Carlos! Como que vai a obra na sua casa?

Personagem 2: Rapaz você nem acredita. “Tava” tudo indo bem até começar o banheiro da suíte. O problema tinha que dar justamente no banheiro da Silvia.

Personagem 1: Imagina a cara dela. Mas “que que” deu de errado?

Personagem 2: Não é que eu fui ontem ver a obra e o projeto “tava” todo invertido e o arquiteto disse que não vai voltar atrás.

Personagem 1: Mas “pera”ai, como assim? O projeto não foi assinado pelo arquiteto?

Personagem 2: Claro que foi, mas a obra já “tá” durando um tempão…

Personagem 1: Mas o contrato serve justamente “pra” garantir que todo mundo tenha seus direitos assegurados. Você não pode se intimidar com arquiteto não!

Personagem 2: Você acha?

Personagem 1: Não é legal que uma das partes dependa da boa vontade da outra para ter seus direitos garantidos. É assim também em grandes obras. Se o contrato é desrespeitado e a empresa não tem a quem recorrer, ela fica dependendo da boa vontade de um político. Olha, normalmente isso termina muito mal.

Personagem 2: Não, você tem toda razão!

Personagem 1: Quem sabe o Governo não ouve essa nossa conversa.

Locutor: Funciona no seu dia-a-dia, funciona nas empresas, funciona para o Brasil. Um oferecimento Andrade Gutierrez.

 

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