8M: Uma arquiteta popular dentro da periferia

Karol Rosa de Almeida não pensava muito sobre o futuro quando era criança. Na escola, quando perguntavam o que ela queria ser quando crescer, só tinha certeza de uma coisa: reformar a casa da sua mãe. Nascida no bairro da Restinga, extrema zona sul de Porto Alegre (RS), ela acreditava que a faculdade era um lugar muito distante. “Para você ter uma ideia, eu nem sabia que tinha faculdade privada e pública”, conta. Em 2014, no entanto, decidiu aproveitar a popularidade do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), para tentar realizar seu sonho de infância, e ingressou na graduação de Arquitetura e Urbanismo no Centro Universitário Ritter dos Reis (Uniritter). 

Aos 25 anos, ainda no ano de 2019, Karol concluiu o ensino superior, mas a sua trajetória na faculdade foi marcada por muitos desafios. O primeiro não demorou muito a acontecer: sentir na pele a diferença social existente dentro do curso. “Arquitetura é um curso caro e eu não digo só sobre as mensalidades, mas também sobre as disciplinas que cursamos e os materiais que tínhamos que comprar”, relembra. A profissional conta que era frustrante estudar algo que não representava a sua realidade. “Eu me sentia como um pintinho fora do ninho”.

Em 2017, a quase arquiteta e urbanista foi aprovada no concurso de estágio do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) e, em 2018,  foi estagiária de projetos da Justiça Federal do Rio Grande do Sul. Quando saiu da graduação, Karol viu toda a sua insatisfação do curso refletida no mercado de trabalho. Foi diante dessa situação que ela decidiu iniciar o seu próprio empreendimento social e abriu as portas da Kopa Coletiva. A empresa é voltada para realização de projetos arquitetônicos e reformas para periferia e tem como seu berço, a necessidade de levar arquitetura para as comunidades de Porto Alegre e região metropolitana. 

O machismo também começou a fazer parte da sua rotina, principalmente no início da vida acadêmica. Quando o seu filho Ignácio nasceu, em 2015, ela estava no segundo semestre da faculdade e, além de precisar lidar com a tripla jornada – trabalho, faculdade e casa -, ela teve que aguentar a rejeição dos colegas. “As pessoas não queriam fazer trabalho comigo porque achavam que eu não ia dar conta”, rememora. Para conseguir um estágio na área, não era diferente. Karol sentia os olhares mudarem quando ela dizia que era mãe e morava na periferia. “Eu sempre senti o preconceito e o machismo na forma como era tratada. Até para conseguir parcerias e fazer as pessoas acreditarem no meu trabalho é complicado”, explica. “Transformei isso em força para estudar bastante e ser a melhor, mas é cansativo ter que ficar provando que você é capaz o tempo inteiro”. 

Quando saiu da faculdade, a dificuldade em encontrar emprego foi o pontapé necessário para começar seu vínculo com arquitetura popular. “Precisei ficar um ano fazendo mentorias porque eu não tinha estudado essa área na faculdade”, conta. Isso, segundo Karol, evidencia o quanto a arquitetura precisa ser menos elitista e mais acessível – tanto o curso, quanto a oferta dos serviços. “A gente sabe da necessidade de Arquitetos e Urbanistas no setor público, mas isso quase não acontece”. O resultado são casas irregulares e com risco para saúde das pessoas. “É essa realidade que eu tento mudar aqui na comunidade”, expõe.

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